O que muda na tomada de crédito com a Selic a 10,50% a.a?

A recente valorização do dólar e a crescente incerteza levaram o Banco Central (BC) a desacelerar os cortes na taxa de juros. Por uma estreita margem de 5 votos a favor e 4 contra, o Comitê de Política Monetária (Copom) optou por reduzir a taxa Selic, os juros fundamentais da economia, em 0,25 ponto percentual, estabelecendo-a em 10,5% ao ano. Essa medida estava amplamente prevista pelos analistas financeiros.

 

De acordo com Fábio Murad, sócio da Ipê Investimentos, para o cidadão brasileiro comum, uma taxa Selic nesse patamar implica em juros mais elevados em empréstimos e financiamentos. Isso pode encarecer o custo do dinheiro para a aquisição de bens duráveis, como carros e imóveis, além de complicar o pagamento de dívidas.

 

“Para os empresários, uma Selic mais alta também se traduz em custos de crédito mais elevados. Isso pode dificultar a expansão dos negócios, já que os empréstimos para investimentos em equipamentos, inovação ou aumento da produção se tornam mais dispendiosos. Além disso, pode afetar o fluxo de caixa das empresas com dívidas vinculadas à Selic”, diz.

 

Para o investidor, elenca que uma taxa Selic de 10,50% significa maior rentabilidade nos investimentos atrelados à Selic ou ao CDI, como Tesouro Selic, fundos DI e CDBs. “No entanto, isso também pode indicar um ambiente econômico mais instável, requerendo cautela e diversificação nos investimentos”, explica.

 

Murad aponta que a redução para 10,50% é vista como adequada ao cenário atual, levando em consideração os indicadores econômicos e as expectativas do mercado. “Essa decisão equilibra a contenção da inflação com o estímulo ao crescimento econômico, alinhando as ações do BC com as projeções econômicas e demonstrando sua disposição para ajustar a taxa de juros conforme necessário, o que contribui para a estabilidade econômica”, destaca.

 

Vale lembrar que a redução da Selic promovida ontem pelo Copom foi a sétima consecutiva. Entre agosto do ano anterior e março deste ano, o colegiado havia reduzido os juros básicos em 0,5 ponto percentual a cada reunião.

 

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, desempatou a decisão ao votar a favor de um corte de 0,25 ponto. Além de Campos Neto, os diretores Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Otávio Ribeiro Damaso e Renato Dias de Brito Gomes, todos indicados pelo governo anterior, votaram por essa redução. Enquanto isso, os membros Ailton de Aquino Santos, Gabriel Muricca Galípolo, Paulo Picchetti e Rodrigo Alves Teixeira, indicados pelo atual governo, preferiram uma redução de 0,50 ponto percentual.

 

Votação que gera cautela

 

O Economista Volnei Eyng, CEO da Multiplike, frisa que o 5 a 4 [na votação entre os membros do colegiado] implica em uma cautela adicional por parte do investidor, pois demonstra uma “desconexão” entre os diretores. No momento, metade dos executivos está alinhada ao atual governo e a outra metade está alinhada ao governo anterior. 

 

Para se ter ideia, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem mandato válido até o final deste ano e somente depois o governo poderá indicar o novo presidente da autarquia. Por conta disso, ele vem enfrentando oposição dos agentes políticos de situação. 

 

O caso é que a política econômica do atual governo requer um nível maior de gasto e um nível mais adequado de crédito à população, e isso se faz com juro baixo. Porém, por conta da inflação brasileira, bem como da inflação americana, o BC tem mantido a Selic em patamares elevados para segurar os preços no país e, assim, conter o avanço da inflação. Isso tem gerado algum ruído político no mercado financeiro.

 

A falta de unanimidade entre os membros do colegiado deixa as próximas reuniões do Copom em suspenso e também o ano de 2025 hesitante pelo lado do investidor que terá, desta forma, que analisar mais pormenorizadamente o cenário e promover um rebalanceamento de carteira em busca de alguma proteção”, aponta.

 

Comunicado do Copom

 

Ontem, após a decisão, o Copom informou, em um comunicado ao mercado, que o cenário internacional se deteriorou e que a inflação subjacente, que exclui os preços mais voláteis, está acima da meta de inflação. Também enfatizou a importância da credibilidade do arcabouço fiscal aprovado no ano anterior. Diferentemente das últimas reduções, o Banco Central não deu nenhuma indicação sobre seus planos para os próximos encontros.

 

A taxa está agora no nível mais baixo desde fevereiro de 2022, quando estava em 9,75% ao ano. De março de 2021 a agosto de 2022, o Copom elevou a Selic por 12 vezes consecutivas, em um ciclo de aperto monetário que começou em meio à alta dos preços de alimentos, energia e combustíveis. Durante um ano, de agosto de 2022 a agosto de 2023, a taxa foi mantida em 13,75% ao ano por sete reuniões seguidas, antes de começar a ser reduzida.

 

PMEs diretamente afetadas

 

André Colares, CEO da Smart House Investments, lembra que com a Selic agora neste patamar, as pequenas e médias empresas (PMEs) são diretamente afetadas por essa situação, já que o custo do crédito comercial também aumenta, prejudicando o fluxo de caixa e dificultando investimentos destinados à expansão. “O Sebrae observa que as taxas de juros para empréstimos a PMEs podem atingir até 40% ao ano, tornando praticamente impossível para muitas dessas empresas obter o crédito necessário para manter suas atividades. Além disso, a lentidão na redução da taxa Selic levanta críticas sobre a velocidade considerada ‘inadequada’ na diminuição das taxas, especialmente diante da inflação sob controle “, diz.

 

Segundo ele, a redução para 10,50% foi considerada insuficiente por algumas instituições, que ressaltam que a desaceleração no ritmo de cortes pode dificultar o acesso ao crédito para as empresas, limitando assim o crescimento econômico. “A redução gradual pode estar associada à preocupação com a inflação e com o cenário internacional, mas há críticas de que a economia brasileira necessita de cortes mais substanciais”, afirma.